domingo, 12 de fevereiro de 2012

O Alentejo, o desenvolvimento e o Alqueva

Se há povo manso em Portugal é o Alentejano, atirado de volta à idade média no Estado Novo, ignorado desde Abril de 74, tarda em se erguer e crescer à altura da sua dimensão geográfica.
Nunca se deu nada ao Alentejo, tudo se fez pagar, até a única Auto-Estrada foi sempre paga, enquanto a terceira região mais rica do país, que dizem tem boas praias para quem não conhece as Alentejanas, tinha uma SCUT e nunca nos queixámos. Temos fama de preguiçosos, mas ainda não conheço outro povo que trabalhe a terra de sol a sol em pleno mês de Agosto. O pouco que nos foi dado está agora a ser-nos tirado. Hospitais, maternidades, centros de saúde, escolas, tudo vai desaparecendo da região. E quem isso nos tira tem a lata de dizer que a região está a ficar desertificada e envelhecida.
Mas somos um povo bom. Ou estúpido, dependendo do ponto de vista. Desculpamos perfeitos idiotas à frente dos nossos municípios, que nos compram com porcos no espeto, croquetes e rissóis nas festaloras, umas excursões para os velhotes e criancinhas à praia, a troco de cimento e betão para embelezar a nossa rua e brilhar para quem nos visita. E gostamos, tanto que os elegemos uma e outra vez, como queridos líderes vitalícios lá da aldeia, mesmo que os nossos filhos e netos nos abandonem em busca de melhor sorte por paragens longínquas. Aqueles que não o fazem é porque tiveram a sorte de uma cunha na maior entidade empregadora do respectivo concelho, que é como quem diz a Câmara Municipal lá do sítio. Todos comem desta pequena gamela. E calam. Até os nossos empresários são obrigados a mudar a camisola sempre que a Câmara muda se querem manter a porta da loja aberta. Espanha pode estar a um passo e Lisboa ser já ali, mas Alentejano que é Alentejano só faz negócios com Alentejanos. Economia é ainda um conceito abstracto, uma simples palavra que se lê nos jornais lá da capital. De tão plana que a terra é não permite ver mais além, nem o alto da Serra de S. Mamede ajuda a alargar as vistas.
E somos pacientes. Sabemos esperar como ninguém. Essa paciência que é mestra na arte de fazer os melhores vinhos. Engenhosos como poucos a miséria ao longo de décadas obrigou ao bem fazer gastronómico para reconfortar a barriga como poucos o sabem fazer. Mas nem só de bem beber e comer se faz o progresso e o desenvolvimento. Bem sabemos que o calor não ajuda, entorpece o discernimento e a vontade, talvez por isso aguardamos sempre que alguém de fora nos faça os trabalhos de casa, sejam nuestros hermanos ou alguém lá longe na capital. O tamanho também não ajuda, a planície é tão grande que ás vezes parece um saco de gatos, com cada um a puxar a brasa à sua sardinha; Alto e Baixo são vizinhos às avenças, quezilentos sobre quem tem mais. Picuinhices que os vizinhos aproveitam para levar a água ao seu moinho...
Enquanto não percebermos que Alentejo é só um, de todos os Alentejanos, sejam altos ou baixos, não esperemos milagres. Ninguém mais que nós mesmos fará pela nossa terra. Nós e só nós que vivemos as agruras de ser Alentejano é que temos que arregaçar as mangas e colocar mão à obra. Devemos estar à altura que a dimensão da nossa terra obriga, proporcionais em grandeza aos imensos hectares que povoamos.
Tudo isto a propósito das recentes notícias sobre o Alqueva.

Nota: link da notícia com a devida vénia ao João Espinho, do Praça da República.

2 comentários:

Kruzes Kanhoto disse...

Parabéns. Fez um retrato fiel e magnifico da nossa realidade.

André Miguel disse...

Kruzes,
Só espero que o retrato seja temporário e que mudemos para melhor. O Alentejo merece mais.