sábado, 12 de maio de 2012

Estaremos a destruir mercado em Angola?

Na opinião de um colega de trabalho, sim.
Discutimos o assunto durante um almoço, no qual um dos colegas alegava que os portugueses estamos a "destruir" o mercado de trabalho em Angola, com o argumento dos baixos salários que muitas empresas lusitanas começam a pagar por estas bandas. Na realidade não é fora do comum encontrarmos empresas que começam a pagar entre 1.500,00 a 2.000,00 usd aos expatriados. É manifestamente pouco e, incrivelmente, fica em linha com os salários pagos em Portugal. O fenómeno não é de fácil análise e muitos factores contribuem para o mesmo. A estabilidade da inflação, a regulação do mercado, a melhoria do sistema de ensino e o regresso de muitos angolanos qualificados da diáspora explicam muita coisa. No entanto grande parte fica por conta do elevado desemprego em Portugal, que proporciona um manancial de jovens qualificados, que procuram fugir ao desemprego emigrando. Angola está há vários anos na moda, é o maior mercado extra-comunitário das nossas exportações e a sua economia está pujante, o que contribui à imensa procura entre os nossos jovens. A meu ver, uma procura desproporciona, para a qual muito contribuem os nossos media, que insistem nos retratos de um suposto el dorado.
Há quatro ou cinco anos atrás os salários médios dos expatriados rondavam os 4 ou 5 mil usd, entre outras regalias, como casa, carro, viagens, seguros, 45 dias de férias, etc. Hoje, além da redução de salários já referida, as condições podem ser partilhar casa e carro com os colegas, apenas uma viagem, 30 dias de férias e por aí abaixo... Portanto do ponto de vista dos custos para as empresas é uma boa notícia, pois conseguem mais oferta para as suas vagas a preços muito mais baixos. Onde a porca torce o rabo é que, num mercado com estas especificidades, desta forma dificilmente conseguirão seduzir os melhores quadros, pois se há 4 ou 5 anos atrás não vinha para Angola quem queria, mas quem podia e as empresas, graças aos elevados custos que suportavam, procuravam os melhores, hoje qualquer um pode (ou sujeita-se a) vir. Chegava a haver um par de candidaturas para 10 vagas, hoje para uma só vaga chovem CV's, assim um expatriado já não é um investimento, mas sim um recurso mais qualificado. A prova disto é que muitas empresas estrangeiras aqui presentes começam já a recrutar quadros portugueses, algo impensável há uns anos atrás. Se a isto somarmos o provincianismo da maioria dos nossos empresários, para os quais lucro fácil e rápido é o fim de toda a acção e gestão de recursos humanos se limita ao processamento salarial, então o cenário tenderá a ficar ainda mais negro. Conheci há anos um engenheiro alemão que estava aqui com a mulher e os quatro filhos, com tudo pago, inclusive a escola privada das crianças, pela sua empresa e isto é algo impensável para a esmagadora maioria das empresas portuguesas, as quais, por norma, colocam imensos entraves à vinda da família pelo custo que tal pressupõe (no meu caso não me posso queixar, pois é uma honrosa excepção em todos os aspectos); ora se as empresas estrangeiras já estão a recrutar mais quadros portugueses em detrimento dos seus concidadãos, pode significar que se estão a ajustar às práticas das suas congéneres lusitanas, até porque o desemprego em Portugal não lhes passa ao lado. Se a juntar a tudo isto constatarmos que a esmagadora maioria das empresas estrangeiras são portuguesas, que a maior fatia do investimento estrangeiro é português e que nós somos a maior comunidade estrangeira de Angola, então o caminho que o mercado laboral irá tomar ficará ainda mais óbvio. Se será bom ou mau, só o tempo o poderá dizer.

Já que falamos de mercado de trabalho e desemprego não posso deixar de comentar as palavras de Passos Coelho sobre a oportunidade que este pode ser.
Há coisas que podemos pensar e acreditar, mas não devem sair da boca para fora. Eu sei o que é o desemprego e até posso dizer que foi uma oportunidade para sair do país e crescer, mas na situação actual as palavras do nosso PM são de uma leviandade desnecessária e perigosa. Numa sociedade individualista e liberal ficar desempregado não é uma calamidade, pois tal deve-se a algo palpável, e de certa forma controlável, pelos indivíduos, mas numa sociedade socialista, onde tudo é decidido por instâncias superiores e a nível central, onde tudo surge por decisão de um aparelho centralizado, impessoal e distante, onde as decisões focam os grupos em detrimento das partes, a situação de desemprego surge em massa e por força, decisão e vontade de outros. Ora neste cenário as pessoas sabem perfeitamente porque estão desempregadas e, ao invés de se tornarem empreendedoras e activas para melhorarem a sua situação, irão cobrar a sua desgraça a quem dita as políticas centrais, do país ou da UE, que as empurraram para esta situação. E quem planifica as políticas que ditam o destino não pode de forma alguma sacudir as suas responsabilidades desta forma.

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