sábado, 7 de julho de 2012

Notas soltas sobre um país visto ao longe

O caso da licenciatura do Ministro Relvas mostra como somos um país de doutores. Não importam as competências pessoais e profissionais, num país desprovido de mérito só conseguimos ser reconhecidos com um canudo na mão. Jogo de aparências, complexo de inferioridade, sociedade de castas, chamem-lhe o que quiserem, na realidade é uma sociedade sem valores, que reconhece as pessoas pelo titulo que ostentam e não pelas suas  capacidades. Relvas apenas seguiu a corrente.

Enfermeiros contratados a quatro euros à hora não devia chocar ninguém. Já analisaram a quantidade de vagas em enfermagem disponíveis todos os anos nas universidades? Estamos perante um simples caso de oferta e procura, nada mais. O desfasamento entre a oferta educativa e o mercado de trabalho em Portugal é brutal, mas continuamos alegremente a assobiar para o lado enquanto nos escandalizamos pelos baixos salários de uma horda de licenciados desnecessários. Não há inocentes nestes casos. Que sirva, pelo menos, para repensar todo o sistema de ensino superior, onde a asneira começa no sistema de acesso que empurra milhares de estudantes para cursos que não queriam como primeira opção, bem como desnecessários ao nosso mercado tal a enormidade de vagas disponíveis. Grande parte da nossa crise passa por aqui, onde a muitas bolhas acabámos de juntar a da educação.

O General Romano Galba escreveu que "Há, na parte mais ocidental da Ibéria, um povo que não se governa, nem se deixa governar". Bem podia estar a referir-se à actual situação do país e em particular ao recente acórdão do TC sobre os cortes no subsídios da função pública. Em Portugal o homem sonha, o Governo decide e a Lei limita. Há décadas que assim é. Pelo menos talvez assim quem nos governa comece a trabalhar a sério, ao invés fazer sempre as coisas pelo caminho mais fácil. O facilitismo é o caminho dos incompetentes e dos fracos e destes não reza a História a não ser por maus motivos. Há muito por onde cortar sem ser àqueles que mal têm para comer e pagar as contas do lar. Não o fazer é alimentar a monstruosa mentira que o Estado português gasta correctamente o dinheiro dos nossos impostos.

A contestação saiu à rua. Não há dia em que não haja gritos e insultos a qualquer membro do governo onde quer que ele vá. Não que seja injusto, mas dizem que Paris nesta altura do ano é muito agradável. Acho que a malta anda a reclamar a factura ao funcionário errado, se bem que este até agora não mostrou lá muito serviço, já que a casa está a ser gerida em regime de outsoursing (leia-se Troika). Mas quem nos governa ou é muito honesto ou muito ingénuo, caso contrário, para acalmar os ânimos à malta, já tinham prometido um plano de crescimento conjugado com um plano tecnológico, um aeroporto em Curral de Moinas, uma plataforma logística em São João da Murrunhanha, e sei lá, talvez mais 150 mil empregos, não?

2 comentários:

Kruzes Kanhoto disse...

O país vive em estado de negação. Todos incluídos. Governados e governantes. Até os que têm responsabilidades governativas, desde as mais altas até ao presidente da mais insignificante freguesia ainda não estão plenamente convencidos do estado miserável em que estamos. Basta ver que não se toca nos interesses instalados (daqueles a sério) e que qualquer Câmara municipal continua a esbanjar em festarolas o dinheiro que chegava e sobrava para pagar dois ou três subsídios de férias e de natal.

André Miguel disse...

Isso é o que realmente assusta, caro Kruzes.
Ouço muita gente queixar-se, mas porque julgam que aquilo porque estão a passar é desnecessário e que ainda há dinheiro para vícios. Mal sabem elas o que ainda está para vir... Preparem-se.